Para rememorar a minha Inesquecível de hoje, começarei falando um pouco de meu pai – o velho Adriano. Aos finais de semana, meu pai costumava ficar na frente de casa, fazendo suas infusões de bebidas. Enquanto uma bebida filtrava no chumaço de algodão, ele ia adoçando a outra: tal e qual um verdadeiro alquimista. Manipulação vai, manipulação vem: chamava os que iam passando pra experimentar. Sônia, a minha Inesquecível de hoje, era uma dessas pessoas convidadas a ajudá-lo a achar o ponto das infusões. Ela não era muito de beber, mas fazia questão de parar para prosear com seu Adriano. Conversa que durava horas! Dentro de casa, a gente só ouvia as gargalhadas de Sônia: era uma folia só!
Nascida no bairro de São Gonçalo do Retiro em 28 de junho de 1958, Sônia de Almeida Silva era filha de dona Maria de Almeida Silva – dona Dasdores – e de seu Orlando Borges da Silva Filho. Teve doze irmãos, com os quais dividia uma pequena casa no fundo da roça. Anos mais tarde, teve uma filha, Régia Mabel. Em 1976, com 19 anos de idade, Sônia se iniciou para o Orixá Iansã, pelas mãos de Mãe Stella de Oxossi. Seu “barco” foi de seis pessoas; quantidade de “passageiros” em uma iniciação – “barco” é o termo muito utilizado dentro dos Terreiros de Candomblé para nomear os irmãos que nascem juntos e devem crescer unidos por este laço de nascimento para o Orixá. No caso da nossa Inesquecível, foram seus irmãos de santo: Décio de Oxalá; Lourdes de Ayrá; Nice de Ogun; Ivalda de Oxossi – essa já foi rememorada – veja aqui: Ọdẹ Bọ̀wá: O Caçador está chegando - Farol da Bahia e Rita de Xangô. Seu nome de santo – orukó era Oyá Jinã: aquela que desperta o fogo. Pensem numa filha de Iansã proativa? Sônia era essa pessoa!
Foto: Arquivo Pessoal
Sônia foi uma moça muito bonita. Tinha o sorriso largo e era muito simpática. Prestativa aos interesses do Axé se fazia presente em todas as atividades. Ela me chamava de Naninho, apelido que só minhas tias me chamam. Sônia tinha muito amor e fé nos Orixás, isso perdurou até seus últimos dias. A partir das memórias de Sônia, Oyá Jinã, a sua irmã caçula, Georgina de Almeida, carinhosamente chamada de Géo, relembra os tempos difíceis que sua grande família passou naquela época. No entanto, eles não esmoreceram, pois a fé era base fundamental da família, além de receberem também todo afeto de Afonjá, que não deixou que padecessem. “Quantas vezes o Amalá de Xangô matou a nossa fome?”, relembra Géo, emocionada.
Em 31 de agosto de 2015, Sônia concluiu sua trajetória neste plano, partindo para o Orun, onde começou a traçar uma nova trajetória. Assim como o despertar do fogo vivo, Sônia permanece acesa na memória daqueles que a conheceram.
Salve o fogo... Salve Sônia de Oyá.