Cármen Lúcia vota e STF tem maioria para condenar Jair Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado
Decisão histórica marca primeira condenação de um ex-presidente brasileiro por atentado à democracia

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria, nesta quinta-feira (11), para condenar o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro (PL) pelo crime de tentativa de golpe de Estado, por meio do voto da ministra Cármen Lúcia. O placar parcial é de 3 a 1 pela condenação.
A decisão se baseia na denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), que apontou Bolsonaro como chefe do núcleo de maior hierarquia da trama golpista, responsável por dar respaldo político e institucional às ações para se manter no poder após a derrota nas eleições de 2022.
Esta é a primeira vez na história que um ex-presidente brasileiro é condenado por tentativa de ruptura democrática.
Bolsonaro cumpre prisão domiciliar desde 4 de agosto, determinada pelo STF, após descumprir medidas cautelares impostas pela Corte. As restrições incluem o uso de tornozeleira eletrônica, proibição de receber visitas, exceto de familiares e advogados, e recolhimento de todos os celulares no local.
Cristiano Zanin, presidente da Turma, é o próximo e último a votar no julgamento. A expectativa é de que as penas sejam definidas na sexta-feira (12).
Denúncia
Segundo a PGR, Bolsonaro teria incentivado de forma sistemática a propagação de desinformação sobre as urnas eletrônicas, interferido diretamente no relatório das Forças Armadas sobre o sistema de votação, solicitado mudanças na minuta do decreto golpista e participado de reuniões com comandantes militares em que discutiu hipóteses de intervenção.
A acusação também aponta que o ex-presidente tinha conhecimento do chamado plano “Punhal Verde e Amarelo”, elaborado em novembro de 2022 no Palácio do Planalto, que previa o assassinato do presidente Lula, do vice Geraldo Alckmin e do ministro Alexandre de Moraes.
Embora não tenha participado fisicamente da invasão de 8 de janeiro de 2023, Bolsonaro foi apontado como peça-chave na criação do ambiente de instabilidade que culminou nos atos violentos em Brasília, ao respaldar acampamentos em frente a quartéis e encorajar manifestações contra a legitimidade do processo eleitoral.
Desde 2021, ele vinha adotando um discurso de confronto com o Judiciário e o sistema eleitoral, intensificando ataques após a retomada dos direitos políticos de Lula.
Argumentos da defesa
Durante a fase de alegações, a defesa sustentou que não há provas ligando Bolsonaro diretamente ao plano “Punhal Verde e Amarelo” ou aos atos de 8 de janeiro. O advogado Celso Vilardi afirmou que seu cliente foi “dragado” para o processo a partir da apreensão do celular e da delação premiada de Mauro Cid, que classificou como “viciada e sem corroboração”.
A defesa argumentou ainda que atos preparatórios não configuram execução de golpe e que é desproporcional falar em penas de até 30 anos com base em evidências frágeis.
Julgamento
O julgamento é conduzido pela Primeira Turma, composta por Alexandre de Moraes (relator), Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin. As sessões foram marcadas para cinco dias (2, 3, 9, 10 e 11 de setembro) totalizando quase 27 horas de debates.
A decisão de condenação foi tomada por maioria simples, com três votos necessários, marcando um divisor de águas na responsabilização de autoridades que participaram de articulações contra a democracia após as eleições de 2022.
Há também maioria para condenações contra Mauro Cid e Braga Netto por tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito.
A decisão da Primeira Turma do STF terá impacto no futuro político de Bolsonaro e espera que seja utilizada como parâmetro para casos semelhantes envolvendo autoridades e militares de alta patente.
Próximos passos
Mesmo com a condenação, especialistas avaliam que Bolsonaro não deve ser preso imediatamente. O criminalista Guilherme Augusto Mota explicou à CNN que a defesa poderá apresentar recursos, como embargos de declaração e, em caso de divergência entre ministros, embargos infringentes, que podem levar o julgamento ao plenário do Supremo.
Apenas após o esgotamento de todos os recursos ocorre o trânsito em julgado, quando a pena se torna definitiva e pode ser executada.
Há ainda a possibilidade de prisão preventiva, caso se avalie risco às investigações, ameaça a testemunhas ou risco de atentado à ordem pública.
Além do ex-presidente, respondem ao processo figuras-chave de seu governo e da cúpula militar e de segurança, como Alexandre Ramagem, Almir Garnier, Anderson Torres, Augusto Heleno, Mauro Cid, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto.