O velho do restelo

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O velho do restelo

Novos problemas se colocam à gestão dos esportes em nosso país, especialmente o futebol, nosso esporte por excelência. Emergimos de uma era autárquica, em que tudo dependia da intervenção do Estado. O futebol não escapou desta sina histórica.

Depois de regado nos canteiros das fábricas e nas areias escaldantes das praias, o futebol se espalhou como um rastilho de pólvora, até tornar-se o esporte mais popular do Brasil. Com isso, atraiu a atenção do Estado e pelo Brasil afora os investimentos públicos erigiram a infraestrutura necessária à um esporte de massas.

Em toda parte, construiu-se estádios, verdadeiros monumentos modernos que enchiam os olhos dos brasileiros, sobretudo quando neles aflorou um estilo de jogo que encantou o mundo, estilo condenado á morte ao impacto dos ritos mercantilistas da nova era.

O futebol reproduzia, desse modo, o modelo de industrialização adotado pelo país, baseado no investimento público, destinado a gerar energia e aço, necessários à política de substituição de importações que vicejava entre nós.

Junto com a Petrobrás, Eletrobrás, Siderúrgica Nacional e tantas outras iniciativas do mesmo jaez, o capitalismo tupiniquim reproduziu ampliadamente as relações sociais de produção, refletindo o mesmo padrão de liberdade existente na democracia republicana, a ideologia jurídica e o próprio trabalho assalariado, este último através do advento do profissionalismo.

Emblemática é a frase do Prefeito do Rio de Janeiro, Mendes de Moraes, na inauguração do Maracanã: “cumprir minha promessa construindo este estádio. Agora, façam o seu dever, ganhem a Copa do Mundo” A aliança moral entre o Estado e o jogo de futebol alcança seu paroxismo na crença de um dos mais festejados jornalistas esportivo de todos os tempos, Mario Filho: “acreditar no Maracanã é acreditar no Brasil”.

O modelo autárquico de desenvolvimento econômico esgotou-se, ensejando à economia nacional enveredar por novos caminhos. Vivemos uma nova era, por que não um novo futebol?

Abandonar de vez o modelo autárquico passa a ser um desafio, perante o qual se colocam os dilemas da nossa própria sobrevivência. Os clubes não sobreviverão se tudo em volta se altera e eles permanecem deitados em berço esplendido!

A tradição dos estádios públicos começa a ser “renegada” por um modelo indefinido, impulsionado por um disfarce no qual os recursos públicos foram largamente utilizados na construção das arenas da Copa do Mundo. Saímos do estatismo escancarado para o estatismo mascarado. É o caminho da perdição!

Felizmente, em muitos casos, uma nova tendência vem impondo um modelo privado, no qual os estádios são submetidos à administração dos clubes de futebol, detentores de “expertise” na matéria. É o caminho da salvação.

Se no primeiro caso, sob o condenável disfarce mencionado, engrenamos a marcha ré, no segundo caso nos deparamos com uma tendência positiva, não só no sentido econômico na era da globalização, mas uma afirmação dos valores locais que, embora tardiamente, poderão redundar no que o sociólogo francês Jean Marie Brohm, referindo-se aos  estádios clubistas, considerou “uma arqueologia de mitos”.

É disso que precisamos: valores identitários numa época de supressão das distâncias que separam o tempo do espaço, de afirmação das culturas locais em oposição à geleia geral e global e de valorização dos mitos e representações míticas e profanas aflorados no inconsciente das coletividades humanas.

O resto é o apanágio do Velho do Restelo, que da obscura praia portuguesa praguejava os mares nunca dantes navegados.

O nosso Bahia já deu os primeiros passos, porém falta muito  chão para chegar ao seu  destino. Chegará, se o petismo estatizante não permanecer obstruindo a jornada.

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