Brasil recebe milhões do governo durante 34 anos, mas segue sem produzir vacina BCG
Obra inacabada e interdições levantam questionamentos sobre investimentos públicos
Foto: Google Street View
Uma fábrica que deveria garantir a autossuficiência do Brasil na produção da vacina BCG, proteção contra a tuberculose, recebeu milhões do governo federal ao longo de 34 anos, sem que nenhuma dose tenha sido fabricada. Apesar de o país não possuir produção própria desde a interdição do único local autorizado, a Fiocruz assinou um acordo para tentar viabilizar a retomada da fabricação.
A Fundação Ataulpho de Paiva (FAP), entidade sem fins lucrativos dedicada ao combate da tuberculose, iniciou a construção de uma fábrica de quase 10 mil metros quadrados em 1989, localizada em Xerém, Duque de Caxias (RJ), com o objetivo de produzir 60 milhões de doses anuais da vacina BCG e a Imuno BCG, utilizada no tratamento de câncer de bexiga. A expectativa era suprir a demanda nacional e internacional.
No entanto, mais de 30 anos se passaram e a fábrica nunca foi inaugurada. A diretoria da FAP justificou, em 2020, que mudanças nas normas sanitárias exigiram atualizações no projeto original para fins de certificação.
Dinheiro público
O governo federal já repassou quase R$ 30 milhões para a construção da planta em Xerém, de acordo com informações obtidas através de um pedido de acesso à informação. Além disso, o Ministério da Saúde efetuou repasses de pelo menos R$ 22 milhões à fundação em convênios desde 2012. No entanto, não foram disponibilizadas informações sobre repasses anteriores e se a fundação prestou contas dos atrasos.
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) também contribuiu com o financiamento da obra, concedendo um empréstimo de R$ 5,9 milhões à FAP em 2011. O banco afirmou que verificou a correta aplicação dos recursos e que o financiamento foi completamente quitado em novembro de 2022.
Única fábrica interditada
Atualmente, o Brasil possui apenas uma fábrica autorizada a produzir a vacina BCG, localizada em São Cristóvão, no Rio de Janeiro, porém, encontra-se interditada desde novembro de 2021 para se adequar às normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Essa mesma fábrica já havia sido interditada pela agência em 2016 e 2019. A Anvisa informou que, na inspeção de 2021, a empresa se comprometeu a suspender voluntariamente suas operações até que se adeque às boas práticas de fabricação.